sexta-feira, novembro 11, 2005

O MACHADO DE DEUS

É contado pelo profeta Jeremias, no livro de I Reis, capítulo 6, versículos 1 a 7, que certa vez o profeta Eliseu estava na escola donde eram instruídos os discípulos dos profetas e que um deles veio lhe falar sobre o intento de aumentar o lugar donde viviam, pois já estava muito apertado para comportar a todos. A proposta do discípulo era que, reunidos, fossem cortar madeira às margens do Rio Jordão, madeira esta que seria utilizada para o aumento da construção donde viviam os discípulos dos profetas:
1 Disseram os discípulos dos profetas a Eliseu: Eis que o lugar em que habitamos contigo é estreito demais para nós.
2 Vamos, pois, até ao Jordão, tomemos de lá, cada um de nós uma viga, e construamos um lugar em que habitemos. Respondeu ele: Ide.
Primeiramente o profeta Eliseu ordenou-os que fossem sozinhos, porém, convidado pelo discípulo para ir junto, acatou o convite e foram todos às margens do Rio Jordão cortar madeira:
3 Disse um: Serve-te de ires com os teus servos. Ele tornou: Eu irei.
4 E foi com eles. Chegados ao Jordão, cortaram madeira.
Como Homem de Deus que era dirigido pelo Espírito Santo, certamente Eliseu percebeu que Deus se utilizaria daquela empreitada para proclamar profeticamente a vinda e o ministério de Seu Messias. Os versículos 5 a 7 relatam o que aconteceu em seguida:
5 Sucedeu que, enquanto um deles derribava um tronco, o machado caiu na água; ele gritou e disse: Ai! Meu senhor! Porque era emprestado.
6 Perguntou o homem de Deus: Onde caiu? Mostrou-lhe ele o lugar. Então, Eliseu cortou um pau, e lançou-o ali, e fez flutuar o ferro,
7 e disse: Levanta-o. Estendeu ele a mão e o tomou. O profeta Eliseu
O machado, que era instrumento de trabalho importantíssimo naquela época, havia sido emprestado mui provavelmente porque os que emprestaram não tinham condições de adquiri-lo. Como então pagariam pelo machado perdido? Daí o “ai” e o lamento do discípulo ao profeta, tanto porque estaria comprometida sua tarefa, como porque teria de ressarcir o machado sem ter condições para tanto.
Eliseu prontamente perguntou ao discípulo onde havia caído o machado e é aí que começa o ato profético, ou seja, o momento em que Eliseu, através de um ato aparentemente relacionado às circunstâncias do momento, chama à existência a vida terrena e o ministério do Filho de Deus.
Para entender o ato profético é necessário investigar um momento ocorrido centenas de anos após, qual seja, o batismo de Jesus no mesmo Rio Jordão, que está registrado no evangelho de Mateus, capítulo 3:

5 Então, saíam a ter com ele Jerusalém, toda a Judéia e toda a circunvizinhança do Jordão;
6 e eram por ele batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados.
7 Vendo ele, porém, que muitos fariseus e saduceus vinham ao batismo, disse-lhes: Raça de víboras, quem vos induziu a fugir da ira vindoura?
8 Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento;
9 e não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão.
10 Já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo.
11 Eu vos batizo com {com; ou em} água, para {para; ou à vista de} arrependimento; mas aquele que vem depois de mim é mais poderoso do que eu, cujas sandálias não sou digno de levar. Ele vos batizará com {com; ou em} o Espírito Santo e com {com; ou em} fogo.
12 A sua pá, ele a tem na mão e limpará completamente a sua eira; recolherá o seu trigo no celeiro, mas queimará a palha em fogo inextinguível.
13 Por esse tempo, dirigiu-se Jesus da Galiléia para o Jordão, a fim de que João o batizasse.
14 Ele, porém, o dissuadia, dizendo: Eu é que preciso ser batizado por ti, e tu vens a mim?
15 Mas Jesus lhe respondeu: Deixa por enquanto, porque, assim, nos convém cumprir toda a justiça. Então, ele o admitiu.
16 Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre ele.
17 E eis uma voz dos céus, que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo.
Na passagem de Mateus, única no Novo Testamento que contém a palavra “machado”, não é coincidência que João Batista afirma que já estava posto o Machado junto à raiz das árvores. O Machado de Deus que já estava na Terra era, obviamente, Jesus e quanto à raiz das árvores tem duas aplicações. Na primeira aplicação o termo “árvores” diz respeito à linhagem judaica e o termo “raiz” diz respeito ao patriarcado de Abraão, tido pelos interlocutores fariseus e saduceus como sua justificação de pecados. A este argumento João adverte que “já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo”, ou seja, a justificativa humana de salvação em função dos frutos do patriarca – a fé, uma vez que Abraão foi justificado por fé – era posta por terra, vigorando a salvação pessoal fundada nos frutos pessoais, frutos estes dignos de arrependimento, como mencionado por João Batista pouco antes (v.8). Deveriam os ouvintes crer por si mesmos para que isto lhes fosse imputado por justificação, não bastando a fé do patriarca. Ademais, tal fé deveria ser viva, ou seja, acompanhada de frutos de arrependimento genuíno. Quem não apresentasse tais frutos seria cortado e jogado no fogo, símbolo de perdição eterna.
Na segunda aplicação “raiz” diz respeito ao coração e “árvores” diz respeito aos homens, portanto, o Machado, que é Jesus, estaria posto aos corações dos homens, sendo cortado do jardim todo homem cujos frutos não fossem bons, ou seja, não fossem frutos dignos de arrependimento.
Logo adiante, no versículo 16, Jesus é batizado, ou seja, é mergulhado nas águas do Rio Jordão e delas emerge, como o machado do ato profético de Eliseu. Que temor nos é aplicado ao coração quando percebemos o cuidado de Deus na preparação profética do ministério de Seu Cordeiro, centenas de anos antes!
Há outro elemento profético no ato de Eliseu. Trata-se da forma como ele faz imergir o machado da água. Eliseu corta um pau e joga sobre a água, vindo o machado do fundo do rio em direção ao pedaço de pau. Este acontecimento profetisa sobre o Machado de Deus que, sendo batizado no Rio Jordão, iniciaria um ministério ali cujo destino era o madeiro da cruz. Tanto assim que o termo “ets” no hebraico, usado para denominar o “pau” utilizado por Eliseu, e o termo “xulon” no grego, utilizado para denominar a cruz de Cristo, são, ambos, traduzidos como “madeiro” nas Escrituras.
Outra aplicação do texto de I Rs 6 é quanto ao discípulo que perdeu o machado na água. Se o machado não flutuasse e viesse ao encontro do madeiro, nunca o discípulo o acharia no fundo o Rio Jordão. Isto nos mostra a imprescindibilidade do Ministério da Cruz na salvação dos homens. Se o machado não tivesse flutuado em direção ao madeiro o discípulo permaneceria devedor do mesmo ao seu dono. O flutuar do machado em direção ao madeiro remiu o discípulo da dívida que teria caso tivesse perdido o instrumento de trabalho. Este é o ministério remissivo da cruz de Cristo, que nos livra de nossas dívidas.
Isto nos mostra como Jesus já prefigurava em cada mínimo acontecimento da vida dos profetas e como estes criam na vida e ministério do Messias, profetizando, a cada momento, quanto à Sua vinda.

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