sexta-feira, janeiro 29, 2021

DEUS SE ARREPENDE?

Na língua portuguesa a palavra "arrepender" é verbo e "arrependimento" é o substantivo que indica o efeito da ação daquele verbo. O substantivo ocorre 24 vezes na Bíblia e apenas 02 vezes no Velho Testamento, sendo que ambas referem-se ao efeito de um ato de Deus e não do homem. 

As formas verbais de "arrepender" ocorrem 79 vezes na Bíblia e a procura nos mostra que o sujeito do ato de se arrepender invariavelmente é o SENHOR no Velho Testamento e o homem no Novo Testamento. 

Então Deus se arrepende? 

Em verdade não, aliás, é a Bíblia que responde essa pergunta ao dizer que "Deus não é homem, para que minta; nem filho de homem, para que se arrependa" (Nm 23:19 e I Sm 15:2). 

Então de onde advém as dezenas de referências ao arrependimento Divino no VT? 

Essas referências decorrem da tradução do hebraico para o português, e do grego para o português, de palavras que são bem diferentes. 

No Velho Testamento, as duas únicas ocorrências traduzidas como "arrependimento" advém de "nacham" e "nocham". O primeiro está em Jeremias 31:19 e profetiza sobre o que o povo um dia diria (que se arrependeria) e o segundo está em Oséias 13:14, quando o SENHOR diz que seus olhos estarão fechados para a compaixão, ou seja, que Ele irá derrotar o inferno sem arrependimento. 

Já no Novo Testamento, as 22 ocorrências de "arrependimento" advém quase todas do grego "metanoia", que significa mudança de mente. Esse termo é aplicado ao homem que se converte e não a Deus, até porque o SENHOR não muda (Ml 3:6).

Portanto, o arrepender-se do VT é ato Divino de compaixão em razão da justa aplicação da justiça ao objeto do amor do SENHOR, que é o homem. 

É como aquelas vezes que você corrige seu filho com a varinha e, ao vê-lo chorar, se arrepende, mesmo sabendo que fez o certo. Não se trata de  arrependimento de pecado e sim de sentimento de compaixão pelo sofrimento daquele que é alvo de sua justiça. 

Poderíamos dizer que todo pecado requer arrependimento, mas nem todo arrependimento advém de pecado.

Já o arrepender-se do NT é ato humano de mudança de pensamento e comportamento em razão de alguém admitir o seu pecado. 

O "arrependido" no VT é o nosso Deus, pois dentre os homens "ninguém há que se arrependa da sua maldade" (Jr 8:6). Já no NT o arrependido é o homem, pois o maior profeta da Lei começa o NT pregando algo novo até então, qual seja, que os homens se arrependam e não apenas sacrifiquem, entendimento esse que abre os caminhos do SENHOR Jesus. 

Daí por diante, toda a mensagem do NT é no sentido do arrependimento e de seus frutos, para os quais somos chamados, contristados, batizados e renovados (Mt 3:8, 9:13, 2 Co 7:9, Hb 6:6). 

O pecado separa o homem de Deus tanto no VT como no NT, mas as pazes com o SENHOR decorrem de atos diferentes nas duas alianças, pois no VT a  reconciliação exigia um sacrifício por ano de pecados e, no NT, a mesma reconciliação se opera por remissão, com um único sacrifício vitalício cuja eficácia pessoal exige fé não fingida em Cristo Jesus e sua obra e arrependimento de pecados, pois "com uma única oferta, aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados", de modo que "onde há remissão destes, já não há oferta pelo pecado" (Hb 10:14 e 18). 

Sola gratia de fato significa que a salvação é por graça por meio da fé, todavia, essa é a nossa parte na salvação. A parte de Jesus é julgar se essa fé é viva - evidenciada por obras de um legítimo pequeno Cristo - ou se é uma fé fingida e morta, fruto de uma crença em Cristo como sendo um servo do Ego em vez de Senhor dele. 

Um servo não paga a vida de seu senhor, mas sim o inverso, logo, quem quer ser salvo por Cristo precisa se voluntariar a ser seu servo, sem o que o resgate dele se torna inócuo. O servo, por sua vez, faz a vontade de seu senhor e não a própria. Muda de mente quanto ao certo e errado e enquadra seus atos à obediência de seu senhor. 


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